"Os Rejeitados" é puro amor

Louis Vidovix
3 min readJan 6, 2024

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“Os Rejeitados”, o novo filme do diretor Alexander Payne, começa com um trio de personagens que ninguém escolheria como companhia para as festas de fim de ano e termina como o retrato de três indivíduos que passamos a amar.

São eles: Paul (Paul Giamatti), um professor de História estrábico e rabugento, desprezado pelos alunos e pelos pares, e mais interessado no estudo das civilizações antigas do que em criar vínculos com os seus contemporâneos; Mary (Da’Vine Joy Randolph), enlutada pela morte do filho no Vietnã e cozinheira no colégio interno onde Paul se enclausurou décadas antes; e Angus (o estreante Dominic Sessa), um adolescente petulante que se vê forçado a permanecer no internato durante o recesso de Natal de 1970, sob a tutela de um resignado Paul, quando a mãe parte em lua-de-mel com o novo marido.

Pelas vias do roteiro afetuoso de David Hemingson, as interações deste grupo unido à contragosto vão se desenrolar como um exercício de empatia, que se manifesta de formas diferentes em cada vértice do triângulo — e que leva o espectador a conhecer a humanidade dos personagens à medida em que eles próprios a redescobrem em si, e uns nos outros. A tragédia pessoal de Mary, por exemplo, aflora em Paul uma sensibilidade que há muito parecida extinta, e que reconfigura também a sua relação com Angus.

Ao enxergar o outro para além das percepções limitadas, Paul e Angus não só ressignificam a sua convivência, mas recuperam um bocado de fé no mundo que encaravam como hostil. Para Paul, há uma ponta de esperança de que a geração futura não seja de todo um caso perdido e que alguns, ao contrário de suas previsões mais pessimistas, ainda podem preservar os valores que lhe são caros como educador. Para Angus, há o entendimento que o passado não o define e que a história de sua vida adulta não está decretada.

A aproximação gradual entre mestre e aluno, aliás, jamais recorre aos clichês habituais: os personagens não se transformam da água para o vinho, tampouco abandonam por completo os aspectos menos “cativantes” de suas personalidades. As características que os tornam “rejeitados” continuam com eles — com a diferença de que, ao evoluir para uma compreensão e respeito mútuos, Paul, Mary e Angus percebem-se menos sozinhos em sua solidão, mais leves sob o peso de suas bagagens emocionais, e mais otimistas sobre o que a vida lhes reserva.

Como em “Sideways” e “Nebraska”, os trabalhos mais notáveis de sua filmografia, Payne captura aqui a dor e o humor da experiência humana com completo domínio do tom, e extrai do ótimo elenco interpretações que captam todas as sutilezas e nuances do texto. No caso de “Os Rejeitados” há ainda um bônus: a ambientação no período natalino, propício para narrativas tão divertidas como tocantes. Visto como representante do gênero dos "filmes de Natal", este é certamente um clássico instantâneo para se incluir na lista de revisões anuais.

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